Eu, Olga Hepnarová

A construção psicológica de uma assassina em massa…

 

 

Dos diretores Tomás Weinreb e Petr Kazd, é uma história baseada em fatos reais. Uma narrativa sem julgamentos sobre a última mulher executada na Tchecoeslováquia, na década de 1970.

Olga Hepnarováera uma jovem, lésbica e solitária, de uma família emocionalmente distante, e que não conseguiu desempenhar o papel que a sociedade desejava dela. Seu comportamento paranoico e sua incapacidade de se conectar a outras pessoas levaram-na ao limite quando ela tinha apenas 22 anos de idade.

O filme mostra o ser humano por trás da assassina em massa sem glorificar nem minimizar o terrível crime que ela cometeu. Guiada por suas cartas, mergulhamos na psique de Olga e testemunhamos o agravamento de sua solidão e alienação ao reconstruir os eventos que levaram a suas ações desastrosas.

O mal faz parte do ser humano. Embora a história se passe na década de 70, jovens de todo mundo, hoje, ainda enfrentam problemas por não pertencer a um grupo, por serem diferentes e são intimidados por causa de sua raça, gênero ou orientação sexual.

 

Nota dos diretores Tomás Weinreb e Petr Kazd

Filmamos a história sombria de Olga Hepnarová como um drama existencial cujo personagem principal ousa a viver por seu próprio código moral.

É uma história de anti-detetive, onde dizemos desde o começo que Olga Hepnarová cometeu um assassinato múltiplo. Isto nos dá a chance de focar no nível existencial da história e perguntar por que ela fez o que fez.
Esta dimensão é sublinhada pelo fato do personagem de Olga Hepnarová estar em cada cena do filme.

O filme é filmado em preto e branco e de um modo estilisticamente simples. Não é um filme retrô, mas uma abordagem moderna em preto e branco para uma imagem macia e cinza. Nós focamos no personagem principal e em seu rosto, mesmo quando no decorrer da história Olga encontra muitos outros personagens que compõem a sociedade.

O ritmo é mais lento, a edição focada, mantendo as coisas juntas. O que importa na história que nos é apresentada não é o próprio ato de homicídio múltiplo, mas o contexto e os eventos precedentes que levaram a ele. O objetivo final da violência e a própria forma que aconteceu assim como a reivindicação ideológica dada pela própria jovem ainda são importantes no mundo de hoje: “Não me arrependo do que aconteceu na rua. Não era minha intenção matar aquelas pessoas em particular, não me importava quem iria morrer. Era o princípio que importava, e eu queria cumpri-lo.”

Qual é a diferença entre um jovem que atira em metade de sua escola em algum lugar da América ou Europa, e Olga Hepnarová, uma jovem tcheca de 22 anos que dirigiu um caminhão sobre um grupo de pessoas? Eles não experimentaram a mesma frustração, indiferença no seus ambientes sociais e sentimentos de alienação? Eles não são os mesmos com seus repetidos gritos por ajuda? O destino de cada um não está mais perto do que se pode esperar? As suas motivações não são realmente as mesmas? Essa semelhança não prova que o caso “daquela garota com o caminhão”, como era dito na época, possui um significado alterado pelo tempo e aplicável em qualquer lugar, permanecendo como o pão diário dos criminologistas? Como é possível que tais casos ainda aconteçam hoje e todas as instituições, organizações, igrejas, ciência médica avançada e psicologia, todos mecanismos criados para prevenir acidentes falhem repetidamente?

Sem dúvida, Olga Hepnarová era diferente. Ela cresceu tímida e tentou se manter discreta, com cabeça baixa e seus lábios envoltos em um sorriso secreto. Era o fato de ela ser diferente que a colocava em constante conflito com os outros. Ela ficou distante, doente e frustrada, mas a sociedade em que vivia tinha os mesmos atributos.

Mesmo que nossa época seja de democracia e liberdade, fenômenos iguais parecem continuar aparecendo. Mesmo hoje, um sentimento de melancolia persiste em toda a sociedade. Em um ambiente relativamente próspero, existe um sentimento de solidão e alienação no meio de cidades lotadas. Em um nível individual, os sentimentos de ser diferente ou intimidado são perpetuados, bem como os elementos de racismo e assédio. Não é visível que os fenômenos sociais de hoje, como a popularidade generalizada dos animais de estimação, explicam uma deterioração das relações interpessoais? Não é apenas uma questão de tempo até que o próximo indivíduo ou grupo do mesmo tipo como Olga Hepnarová aparecerá?

“Eu sou uma “Prügelknabe” (vítima de perseguição – bullying). Eu gostaria de pedir que parassem de gerar essas criaturas. Porque assim, mais ninguém pensaria como eu e faria o que eu fiz.” – este foi um dos motivos que Olga Hepnarová usou para se defender na corte.

Não esqueçamos que os crimes do indivíduo são sempre muito mais aparentes do que os crimes cometidos pela sociedade de que todos somos parte. Nós nos escondemos na multidão com mais frequência do que defendemos os direitos do indivíduo. Isto é tão verdadeiro hoje como era há anos atrás.

A história de Olga Hepnarová é a de uma pessoa solitária que se define em oposição à maioria, uma história na qual ninguém ganha e ninguém é derrotado.

Ninguém deve tirar o direito de isolamento, mas há uma grande diferença se alguém escolhe o isolamento ou se é forçado a fazê-lo pela sociedade. Ainda não há resposta para a questão de saber se Olga Hepnarová foi atraída para a solidão por causa de si mesma e simplesmente falhou ou se ela foi forçada a isso por seu ambiente emocional e adverso. Uma sociedade que trata os indivíduos assim como a si mesma injustamente está doente e cria pessoas doentes.

O filme, entretanto, não glorifica o ato de Olga Hepnarová. O filme gostaria de transmitir que ninguém tem o direito de aumentar esse sofrimento – nem o indivíduo (ato de Olga Hepnarová), nem a sociedade (a execução dela).

O filme também está tentando encontrar as causas dessa tragédia – aquelas que podemos evitar hoje (mais psicologia empática, aumento da tolerância das minorias sexuais, a codependência emocional de crianças e pais …) e aqueles que não podemos mudar (o mal é parte integrante dos seres humanos).

Na história de Olga gostaríamos de enfatizar acima de tudo a frieza e crueldade na sociedade como um todo. As pessoas se tratam com indiferença, sem empatia e compreensão, interessadas apenas em si mesmas. Por isso, o que queremos salientar é que, em relação ao ato Olga Hepnarová, a culpa e responsabilidade são compartilhados por todos os que entram em sua história.

Conectado ao sentimento de isolamento e solidão é como Olga Hepnarová, depois de um certo ponto na história, quando ela já não pode tolerar a falta de empatia ao seu redor, se afasta por conta própria para o bem. Ela traz à existência Sandy Winiferová e esconde nela os últimos fragmentos restantes de sua moralidade. Sandy, ao contrário de Olga, está limpa.

O mundo torna-se assim uma massa abstrata e sem emoções para Hepnarová, com o qual ela pode lidar da mesma maneira abstrata e sem emoção. Ou com base na situação que provoca a manipulação de seu ambiente e é destinado a criar ódio contra ela e, assim, confirmar seus pensamentos. Ou com espaço infinito para um jogo que leva ao – aparentemente irracional – assassinato em massa.


Co-produção entre República Tcheca, Polônia, Eslováquia e França, a obra é distribuída no Brasil pela Supo Mungam Films e foi um dos filmes apresentados durante a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo em 2016. Trata-se do primeiro longa-metragem da dupla de diretores e foi o filme de abertura da Mostra Panorama do Festival de Berlim no ano passado.

 

Equipe:
Direção e Roteiro: TomásWeinreb e Petr Kazda
Argumento: Roman Cílek
Produtores: Tomás Weinreb, Petr Kazda, Vojtech Fric, Marcin Kurek, Sylwester Banaszkiewicz, Marian Urban
Direção de Fotografia: Adam Sikora
Montagem: Vojtech Fric
Direção de Arte: Alexander Kozák
Figurino: Aneta Grnáková
Cabelo e Maquiagem: Alina Janerka
Som: Richard Müller
Produção: Black Balance, love.Frame, Media Brigade, Alef Film e Arizona Productions
Distribuição Nacional: Supo Mungam Films
Elenco:
Michalina Olszanska como Olga
Martin Pechlát como Miroslav
Klára Melíšková como mãe de Olga
Marika Šoposká como Jtika
Juraj Nvota como Advogado Kovár
Marta Mazurek como Alena
Zuzana Stavná como irmã de Olga

Biografia e Filmografia dos Diretores
TomásWeinreb (nascido em 1982) & Petr Kazda (nascido em 1978) formaram-se no Independent Film College em Pisek e também na Film School of the Academy of Perfoming Arts (FAMU) em Praga, respetivamente do departamento de cinema documental e roteiro. Trabalharam juntos em muitos curtas-metragens de ficção e documentais exibidos em vários festivais internacionais. Eu, Olga Hepnarová é o primeiro longa-metragem da dupla e foi o Filme de Abertura da mostra Panorama do Festival de Berlim.
Antero (2003 curta-metragem) / Story of Unborn Child (2005 curta-metragem) / Eclipse (2016 curta-metragem) / Jan 007 (2007 curta-metragem) / Everythings is Crap (2009 curta-metragem) / I&Me (2009 curta-metragem) / Many Men and Many Women (2009 curta-metragem) / Playoff (2011 curta-metragem) / Eu, Olga Hepnarová (2016)

Festivais e Prêmios
Festival de Berlim -Panorama (Filme de Abertura)
Sofia International Film Festival (Prêmio de Melhor Direção)
Hong Kong International Film Festival
Vilnius International Film Festival (Prêmio de Melhor Filme)
Guadalajara International Film Festival
Karlovy Vary International Film Festival
Taipei Film Festival
Festival du Film Subversif de Metz(Prêmio do Júri e Prêmio do Júri Jovem)
Melbourne International Film Festival
Reykjavik International Film Festival
Art Film Fest Košice(Prêmio de Melhor Atriz)
Mostra internacional de Cinema de São Paulo
Seville European Film Festival
Cairo International Film Festival
Minsk International Film Festival (Melhor Direção e Melhor Atriz)
Tarkovsky Film Festival -Zerkalo (Grande Prêmio da Crítica Jovem)

Fotos: Divulgação

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