Ator se reveza em 15 personagens e utiliza música e olhar contemporâneo em clássico de Shakespeare…
O clássico Júlio César, de William Shakespeare (1564-1616), escrito em 1599, ganha os palcos de uma maneira diferente. A Paixão de Brutus traz o ator Pedro Sá Moraes se alternando em 15 personagens e um narrador, além de cantar e tocar músicas originais, para colocar em cena uma história que traduz questões perenes da política e da vida em sociedade. Com direção do argentino Norberto Presta, o solo de teatro-canção está no Teatro Pequeno Ato. tem sessões sábados e domingos, sempre às 20h, até 1º de setembro. A temporada tem sessões sábados e domingos, sempre às 20h, até 1º de setembro.
Peça inglesa do fim do século XVI sobre acontecimentos da Roma do século I a.C., Júlio César é um ensaio sobre conspiração e amizade, inveja e política, superstição e poder. A atualidade dos questionamentos levantados na peça foi o que despertou no artista a necessidade de encená-la. “O texto me arrebata porque revela muito sobre o nosso mundo – o ódio político, o jogo de cena, a vaidade – mas não fecha as questões. Não há um grande vilão como em outras peças de Shakespeare, como um Ricardo III ou um Iago (de Othelo). O que existe é um grande espelho, um leque rico de personagens, equivocados, mas fundamentalmente humanos”, conta Pedro Sá Moraes.
Na adaptação, assinada pelo próprio ator, as ideias, diálogos e ritmos do dramaturgo inglês se desdobram em composições inéditas, inspiradas em fontes diversas, dos cantastori italianos aos cordelistas do nordeste brasileiro, das composições para teatro de Chico Buarque, Vinícius e Guarnieri à épica de Bertold Brecht.
Em uma das canções, um samba-canção de inspiração buarqueana, o personagem Brutus, tenta convencer a si mesmo dos méritos da conspiração: “O homem precisa morrer / Ainda que pessoalmente eu não tenha motivo / O homem precisa morrer / São coisas que se há de fazer pelo bem coletivo.” O irreverente Caska explica a Brutus e Cássius num funk irônico o que acontecera no Coliseu para César ficar tão perturbado. “Não prestei tanta atenção / foi comédia surreal / não gasto saliva em vão / Meu nome é Caska / eu falo o essencial! // (…) o homem ficou sufocado, desnorteado com aquele fedor / e caiu no chão de cimento, com a boca espumando, perdeu a cor!”
Em cena, com um violão, o ator e músico entrelaça em uma só partitura a musicalidade dos diálogos à intencionalidade das canções. Ao longo do processo de montagem, que atravessou 2017 e 2018, Pedro e o diretor Norberto Presta chegaram à conclusão de que havia algo de específico na linguagem que desenvolviam, e que não era exatamente um musical. Teatro-canção foi o nome que deram a esta forma de fazer teatro: “A música não está só nas canções, ela é o guia permanente. A voz dos personagens, o ritmo e a intensidade dos diálogos, são regidos por um sentido musical. Os movimentos também nascem da música, como uma dança,” conta o ator.
Ao se permitir liberdades na adaptação de um texto canônico, o artista lança um olhar contemporâneo para o universo Shakespeariano. Referências do cinema, como César Deve Morrer (2012), longa com direção dos irmãos Paolo e Vittorio Taviani, ajudaram a encontrar o tom do diálogo com a obra – franco e irônico, sem perder a gravidade. Este tom se revela já na canção de abertura, composta na forma de um martelo agalopado, estilo utilizado por cordelistas e cantadores no nordeste do país:
…esse caso regressa à minha mente
pois a história não anda só pra frente
– Já dizia um alemão muito citado –
Acontece de modo duplicado:
uma vez é tragédia, a outra é farsa
O autor é figura controversa,
mas falava de um golpe de Estado…
O cenário de Doris Rollemberg, a iluminação de Bernardo Gondim e o figurino, criado coletivamente, são propositadamente minimalistas, indicam a fricção de poder e conspiração, fausto e decadência, que marcam a obra shakespeariana. Mas o fazem de modo sugestivo, sutil. Como tudo no espetáculo, “a intenção é deixar espaço para que o público crie suas imagens e seus entendimentos. Num momento que nos impele a simplificações e verdades absolutas, o teatro pode ser um convite à reflexão pessoal genuína – sobre o pessoal e o coletivo, sobre o ontem e o hoje. A Paixão de Brutus quer ser este convite,” conclui o ator.
Ficha Técnica
Atuação, Adaptação e Composições: Pedro Sá Moraes
Direção: Norberto Presta
Cenografia: Doris Rollemberg
Iluminação: Bernardo Gondim
Fotografia: Davidson Alves
Vídeo: Bernardo Scotti e. Produção (São Paulo) – Cida Serafim
Assessoria de Imprensa: Adriana Balsanelli e Renato Fernandes
A Paixão de Brutus
Teatro Pequeno Ato
Rua Teodoro Baima, 78
Capacidade: 40 Lugares
Duração: 70 minutos
Temporada: até 1º de setembro
Sábado e domingos, sempre às 20h
Ingressos:
R$40,00
R$20,00 (meia)
Classificação: Livre
Ingressos Online: Eventbrite
Sobre o diretor Norberto Presta
É ator, diretor, pedagogo e escritor teatral ítalo-argentino, com mais de 100 peças no currículo, fundador do Centro di Produzione Teatrale “Via Rosse” (Itália). Em 1981 participou do ISTA (International School of Theatre Anthropology) dirigido por Eugenio Barba. Desde então, desenvolve colaborações permanentes com grupos teatrais em vários países; Alemanha, Itália, Argentina, Espanha e Brasil.
Na Europa, ganhou o Prêmio Impulse 1992 Nordheim Westfalen por Terra Felicita; o Prêmio Nacional de Escritura Teatral por “Das Haus” (Alemanha, 1999) e o prêmio de Melhor espetáculo “M. Apostroff99” (República Tcheca, 2002), por “Ella y él”.
No Brasil, assina a direção e dramaturgia do mais recente espetáculo solo de Angel Vianna, “Amanhã é Outro Dia”, e atuou como pesquisador convidado na Unicamp, dirigindo o espetáculo “O que seria de nós sem as coisas que não existem”, do Grupo Lume e “Fuga!”, do Núcleo Fuga em parceria com Lume Teatro.
Sobre o ator Pedro Sá Moraes
É ator e músico do Rio de Janeiro, vencedor do Prêmio Profissionais da Música como Melhor Cantor Brasileiro de 2016. Sá Moraes começou sua carreira musical como intérprete de samba, e ao longo dos anos 2000 compartilhou palco e gravações com mestres do gênero, como Nelson Sargento, Wilson Moreira, Elton Medeiros e outros.
Desde trocar as noites do samba pela dedicação integral à veia autoral, a carreira internacional se abriu em frequentes turnês pela Europa, América Latina, Ásia e América do Norte. Nos Estados Unidos, foi escolhido pela rede nacional de rádios públicas (NPR) como um dos dez artistas revelação de 2012. Seu primeiro álbum, Claroescuro, foi eleito um dos dez melhores discos de World Music de 2010 (Boston Globe). Seu segundo álbum, Além do Princípio do Prazer, foi aclamado pelo crítico do NY Times, Jon Pareles, por sua “suavidade e violência”, num barítono “com ecos de Gilberto Gil”.
Pedro mantém envolvimento contínuo com a dança, teatro e performance há mais de dez anos. Em 2005 e 2006 integrou o duo Corpo Sonoro com o bailarino e coreógrafo pernambucano Henrique Schuller. Entre 2006 e 2011 foi membro do Coletivo Líquida-Ação, sob direção de Eloísa Brantes. Em 2016, a convite da diretora norte-americana Marina Gregory, passou três meses nos EUA, dedicando-se a um treinamento intensivo no método de ações físicas de Jerzy Grotowsky. Também em 2016 foi diretor musical, preparador vocal e ator, no espetáculo Mar de Ressaca, da Cia Impele, com direção de Marco André Nunes.
Foto: Davidson Rocha
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