Como transformar teoria em cena? Como discutir negritude e questões raciais a partir da experiência singular de cada um dos intérpretes? Isto é um Negro? que estreia no dia 2 de março, no Sesc Belenzinho, propõe algumas hipóteses possíveis para essas perguntas…
A montagem, com direção de Tarina Quelho e dramaturgismo de José Fernando Peixoto de Azevedo, traz no elenco Ivy Souza, Lucas Wickhaus, Mirella Façanha e Raoni Garcia.
Isto é um Negro? é também um estudo sobre como implicar e estar implicado em um assunto e, para tanto, explora na cena os limites entre autobiografia e ficção, assim como entre o humor e o constrangimento, misturando diversas linguagens e formatos, do stand-up ao vídeoclipe. Sempre buscando engajar a plateia nestes acontecimentos, é a conversa que dita o tom despretensioso do discurso levado ao palco.
Para a diretora Tarina Quelho, discutir negritude numa equipe formado por negros, negras, brancos, mestiços indígenas e japoneses, foi desafiador e muito importante para construção do espetáculo, e revelou com quem queremos dialogar: um Brasil mestiço e racista. “Enquanto não entendermos que racismo é um sistema e que todos estamos dentro dele, e somente pessoas negras se interessarem por discussões raciais, avançaremos pouco nesta conversa. É preciso que todxs estejam engajados para o fim dessa sociabilidade excludente, escravocrata e cruel, e a peça, como tantas outras iniciativas em vários campos, que falar sobre isso”, explica ela.
Cadeiras amontoadas
Pela mesma porta que o público entra no teatro para assistir ao espetáculo, entram três intérpretes molhados – vestidos e encharcados de água. Olham as pessoas que ali estão para assistir, olham uma pilha de cadeiras brancas amontoadas no proscênio e se perguntam: nós? E logo concluem: nós! Tiram as roupas molhadas, com dificuldade porque estão pesadas e coladas no corpo, e sobem no palco empurrando a montanha de cadeiras brancas. Empurram juntos até que haja espaço para que eles ocupem aquele lugar.
Uma atriz que toma de assalto o espaço que não é dela, um “ex-branco”, uma mulher negra num show de stand up e um menino negro e “bicha” são algumas das figuras criadas pelos atores e que aparecem nas cenas do espetáculo, que tem estrutura episódica e faz da metalinguagem seu brinquedo.
Foi lendo e estudando Angela Davis, Fred Moten, Achille Mbembe, Bel Hooks, Grada Kilomba, Frantz Fanon, Sueli Carneiro, Mano Brown e Aimé Cesaire, que o grupo elaborou as questões presentes em cada uma das cenas do espetáculo.
Diálogo com público
De acordo com Tarina Quelho, a pergunta Isto é um Negro? do título do espetáculo não busca uma resposta ou conclusão e sim friccionar a invenção do negro e tentar elaborar a experiência do que é ser e existir como negro, hoje no Brasil. “A interrogação é uma proposição para o diálogo com o público, a partir do encontro, pensamos sobre como o reconhecimento de nossas trajetórias são pontos de partida para a construção de novas experiências”, conta a diretora.
Em um país que possui maioria da sua população negra e que ao mesmo tempo é cenário de processos de aniquilação desta, da sua cultura e identidade, é necessário enxergar que o racismo opera como método de controle social, regendo desigualdades, velando sua atuação de forma sofisticada, se enraizando de maneira truculenta através das relações de opressões cotidianas e contínuas.
“A inquietação que busca respostas para os efeitos que o racismo produz em nossa sociedade, gera paralelamente uma contra-força que evoca um coro de indivíduos que pretendem através do reconhecimento do seu percurso e compreensão de sua identidade, causar uma ruptura da manutenção de práticas que neguem sua subjetividade. Perguntar é uma forma de negar a manutenção dessas estruturas”, defende Tarina.
Liberdade de expressão
Como campo de experiências sensíveis, a arte tem potência para dar forma a territórios poéticos heterogêneos, onde coexistem liberdades de expressão e expressões de liberdades diversas. Por meio da presente atividade, o Sesc reitera o seu compromisso com a cultura e com a educação, ao trazer à baila produções e processos artísticos que debatem a liberdade de expressão concretamente, em sua imbricação com a liberdade dos corpos – que precisa ser construída permanentemente.
Ficha Técnica
Criação – Denilson Marques, Francisco Lauridsen Ribeiro, Gian Mellone, Ivy Souza, José Fernando Peixoto de Azevedo, Lucas Brandão, Lucas Wickhaus, Mirella Façanha Palomaris Mathias, Raoni Garcia, Tarina Quelho e Tom Monteiro
Direção – Tarina Quelho
Codireção – Lucas Brandão
Dramaturgismo – José Fernando Peixoto de Azevedo
Elenco – Ivy Souza, Lucas Wickhaus, Mirella Façanha e Raoni Garcia
Som – Tom Monteiro
Luz – Denilson Marques e Lucas Brandão
Fotos – Rodrigo de Oliveira
Produção Executiva – Dani Façanha
Direção de Produção – Lucas Brandão e Tarina Quelho
Isto é um Negro?
Sesc Belenzinho
Sala de Espetáculos I
Rua Padre Adelino, 1000 – Belenzinho
Tel.: 2076-9700
Capacidade da Sala: 35 lugares
Duração: 90 minutos
Temporada: de 02 até 11 de março
Sexta-feira, às 21h30
Sábado, às 21h30
Domingo, às 18h30
Recomendado para maiores de 18 anos
Ingressos:
R$ 20,00 (inteira)
R$ 10,00 (estudante, servidor da escola pública, + 60 anos, aposentados e pessoas com deficiência)
R$ 6,00 (credencial plena: trabalhador do comércio de bens, serviços e turismo matriculado no Sesc e dependentes).
Acesso para deficientes físicos
Bilheteria: De terça a sexta-feira das 9h às 21h30 e sábado, domingo e feriado das 9h às 19h30 (ingressos à venda em todas as unidades do SESC)
Estacionamento: R$ 12,00 a primeira hora e R$ 3,00 por hora adicional e R$ 5,50 a primeira hora e R$ 2,00 por hora adicional (credencial plena). Valor promocional para espetáculos noturnos pagos a partir das 17h mediante apresentação de ingresso – R$ 15,00 e R$ 7,50 (credencial plena).
Fotos: Lucas Brandão
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