Segundo trabalho da Cia. Espaço Mágico busca escavar o desassossego das pessoas e continua a pesquisa de Lorenzon na transposição da literatura para o teatro. Em paralelo à nova temporada, a mostra Das Trevas Sonho também prossegue com fotos impressas em metal que celebram a parceria com o fotógrafo italiano Maurizio Mancioli, que traz imagens de dez anos de Lorenzon nos palcos…
Há dez anos, desde que estreou em 2008 a montagem Memória do Mundo, inspirado na obra de Jorge Luis Borges, João Paulo Lorenzon se dedica a explorar o diálogo entre a literatura e o teatro, trazendo à cena espetáculos que mostram essa intersecção e a busca constante em compreender as perguntas que respondemos com a vida: Quem somos nós? O que queremos? O que sabemos? Com quem nos mostramos corajosos? Com quem somos covardes? Essa trajetória atravessou artistas como o escritor argentino Jorge Luis Borges, o francês Jean Genet, o romancista húngaro Sándor Márai, o filósofo francês Georges Bataille, o bailarino polonês Nijinsky, o poeta brasileiro Carlos Drummond de Andrade e continua com a montagem de Todos os Sonhos do Mundo, inspirada no universo do poeta português Fernando Pessoa, espetáculo de sua companhia, a Espaço Mágico, fundada em 2015, que estreia em 6 de outubro, sábado, às 21h, no Viga Espaço Cênico.
Todos os Sonhos do Mundo concentra-se no universo de Fernando Pessoa, essencialmente no pequeno poema Dobrada à moda do Porto, assinado pelo seu heterônimo Álvaro de Campos, em que um homem vai a um restaurante, pede amor e é destratado publicamente sem saber por quê. O desassossego da alma humana e a busca da infância perdida, que pode ser entendida como o desejo de encontro com nosso ser mais amoroso e delicado, regem o espetáculo que procura materializar, em cenas entrecortadas, a nossa crescente falta de afeto e a intolerância no mundo contemporâneo.
“Quando leio Pessoa é como se ele estivesse falando diretamente comigo. Como se ele me confidenciasse segredos. Ele faz com que eu me lembre de mim e reencontre meu silêncio interior. Dobrada à moda do Porto, com suas imagens inesquecíveis, instaurou em mim o desejo de materializar o poema, ainda durante a temporada de Havemos de Amanhecer. Apesar de eu ter feito uma série de espetáculos solos, sinto-me privilegiado por jogar com tantas pessoas na companhia e poder criar algo que chamaria de engrenagem humana de intolerância e repressão”, revela Lorenzon.
Girar em falso
Quinto trabalho ao lado de Lorenzon, Lúcia Chediek, que assina o desenho de luz e a direção de arte, é aliada na materialização das atmosferas literárias para a cena e na instauração da densidade visual a partir das matrizes poéticas. Dos cinco trabalhos em parceria com Lorenzon, Lúcia recebeu indicação ao Shell em Eu vi o sol brilhar em toda a sua Glória e Memória do Mundo. A música original da peça é composta por Manuel Pessoa, que também estava na equipe do premiado Eu vi o Sol brilhar em toda a sua Glória. O cenário, assinado por Walter Manfio, instaura uma imensa porta giratória, como metáfora do girar em falso de nossas vidas, sem sair do lugar, nem saber o que deixamos, nem onde queremos chegar.
Apesar da delicadeza que a poesia pode aparentemente trazer, o espetáculo busca atrocidade e crueldade para criar uma máquina humana de intolerância. A quebra de fronteira entre teatro e dança, assim como aconteceu em Havemos de Amanhecer, espetáculo de estreia da Cia. Espaço Mágico, também é vista no palco nessa nova montagem.
A peça também já tem uma turnê européia marcada até o fim de 2018. Esse é o segundo trabalho de Lorenzon a ir para a terra natal de Pessoa.
Exposição
Além da peça, também no Viga, está em cartaz desde março a exposição de fotos Das Trevas Sonho, sobre a parceria com o fotógrafo e artista plástico italiano Maurizio Mancioli, que traz imagens de uma década de Lorenzon nos palcos. As imagens serão impressas em alumínio. A escolha da impressão no metal foi exatamente para se indagar sobre a indestrutibilidade e a efemeridade do instante no teatro e na vida. A exposição tem curadoria do filósofo e psicanalista Alan Victor Meyer e retrata a parceria de Mancioli e Lorenzon que trabalharam lado a lado em seis espetáculos consecutivos: Água (de 2011, que tem codireção de Maurizio Mancioli); Eu vi o Sol brilhar em toda a sua Glória (2012); Holher Mumem (montagem de 2013, com codireção de Arieta Corrêa); Nijinsky – Minha loucura é o amor da humanidade (estreou em 2014, com direção de Gabriela Mellão); Havemos de Amanhecer (espetáculo de 2016); e Todos os Sonhos do Mundo (2018).
João Paulo Lorenzon é ator e diretor teatral brasileiro, indicado ao Prêmio Shell em 2012 como melhor ator por sua atuação como o escritor cego argentino Jorge Luis Borges no espetáculo Eu Vi O Sol Brilhar em toda a sua Glória. Em 2015, interpretou o bailarino russo Nijinsky na peça Nijinsky – Minha Loucura é o Amor da Humanidade, de Gabriela Mellão, único espetáculo brasileiro selecionado pelo Festival Internacional de Avignon na França. Fundou e dirige a Espaço Mágico Escola de Teatro e a Companhia Espaço Mágico.
Maurizio Mancioli é um artista visual ítalo-suíço, radicado em São Paulo desde 1994. Ganhou prêmios como o Funarte Artes Visuais (São Paulo) e participou de exposições em museus e galerias comerciais no Brasil e no exterior, como MAM-Rio, Galeria Vermelho (São Paulo), AUT OUT Gallery (Toronto), Gallerie Roch (Suíça). Foi representado em São Paulo pela Galeria Rabieh. É também o criador da instalação Acquabox (aquário humano). Os principais signos que caracterizam o conjunto de suas obras são a memória e o isolamento.
Lúcia Chedieck é iluminadora e destaca-se pela originalidade das pesquisas em que se fundamenta para criar a luz de espetáculos e fornecer a esse elemento uma expressiva carga simbólica e estilística. Vencedora do Prêmio Shell de melhor iluminação em 2005, pelo espetáculo Tauromaquia, também foi indicada pelos trabalhos Eu vi o sol brilhar em toda sua Glória e Memória do Mundo, ambos de Lorenzon.
A Cia. Espaço Mágico foi fundada em 2015, pelo próprio João Paulo Lorenzon e recebe o mesmo nome da sua escola de teatro, que funciona desde 2002. A ideia surgiu com o reconhecimento no Festival Internacional de Avignon. O grupo reúne atores e bailarinos e Todos os Sonhos do Mundo é sua segunda montagem. A primeira foi Havemos de Amanhecer, que estreou em 2016 e ainda continua em circulação, sempre em apresentações com a casa cheia.
Ficha Técnica
Direção – João Paulo Lorenzon
Desenho de Luz – Lúcia Chediek
Música Original – Manuel Pessoa
Cenário – Walter Manfio
Fotografia – Maurizio Mancioli
Elenco – Agnes Rumi, Amanda Lisboa, Catarine Gracia, Érika Caroline, Fernanda Chuquer, Helena Fraga, João Paulo Lorenzon, José Gabriel, Larissa Terada, Lisandro Leite, Mariane Wegmann, Michele Mattos e Pamy Rodrigues
Produção – Cia. Espaço Mágico
Todos os Sonhos do Mundo
Teatro Viga Espaço Cênico
Rua Capote Valente, 1323
Tel.: 3801-1843
Capacidade: 83 lugares
Duração: 60 minutos
Reestreia: sábado, 6 de outubro, às 21h
Temporada: Até de 28 de outubro
Sábados, às 21h
Domingos, às 19h
Ingressos:
R$ 80,00
R$ 40,00 (maiores de 60 anos, estudantes, professores da rede pública de ensino com comprovante)
Classificação etária: maiores de 12 anos
Exposição Das Trevas Sonho
Temporada: Até 31 de outubro
Fotos de Maurizio Mancioli
Horário de funcionamento: das 17h as 22h
Fotos: Maurizio Mancioli / Divulgação / Reprodução do Facebook
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