Zibaldone, espetáculo com dramaturgia e direção de Aimar Labaki e textos de Giacomo Leopardi, reestreia em curta temporada, dia 21 de agosto, na Oficina Cultural Oswald de Andrade…
Versos, prosa e diálogos que se tornaram mundialmente conhecidos de Giacomo Leopardi (1798–1837) poeta, ensaísta e filólogo italiano, considerado o maior poeta italiano do século XIX e um dos maiores do romantismo literário ocidental ganham as vozes de Adriana Londoño e Clovys Torres no palco da Oficina Cultural Oswald de Andrade, em encenação inédita de Aimar Labaki. Esta é a terceira temporada da peça que estreou no Teatro Sérgio Cardoso em março e depois fez nova temporada em abril na SP Escola de Teatro em 2017.
O espetáculo é uma experiência teatral radical sustentada apenas na palavra do poeta e no corpo dos atores. Sem recursos de luz ou trilha sonora, num espaço cênico que leva os espectadores ao palco, os atores usam a dança, o teatro, a performance e a poesia para articular, por meio dos textos de Leopardi questões de qualquer ser humano no início do século 21: amor, morte, poder. “É poesia dita ao pé do ouvido”, diz Labaki.
“Buscamos um contraponto entre a ideia de crítica à modernidade presente na obra de Leopardi e a realidade concreta de dois atores imersos em tal modernidade. Não se trata de um retrato do artista, nem tampouco de uma suficiente visita à vastidão de sua obra, mas da procura da atualidade de sua poética por meio do diálogo com a cena contemporânea no que ela tem de busca de essencialidade no corpo dos atores, e na palavra ao mesmo tempo poética e épica da dramaturgia de nossos dias.
Leopardi não é um pretexto. Mas também não é o único em cena. O que queremos é trazê-lo para hoje – sem alterar suas palavras – torná-lo interlocutor da cena e do espectador contemporâneos. Deixar que suas palavras fluam pelo corpo do ator para poder dialogar com a vida dos espectadores”, acrescenta Labaki.
O espetáculo foi concebido para permitir aos atores pleno domínio da apresentação, sem depender de recursos externos. Assim a iluminação é mínima e não há trilha gravada.
Os poucos objetos utilizados se resumem aos necessários para a plena comunicação de uma poesia que não prima pela exuberância, mas pela tranquilidade de sua dicção. E por trechos escolhidos de prosa, diálogos, cartas, diários ou pensamentos que, ainda que altamente provocadores, também não buscam no exótico sua força. Ao contrário, colados ao cotidiano de existência, aspiram à transcendência encontrável no próprio corpo e no diálogo com o outro.
Ficha Técnica
Elenco: Adriana Londoño e Clovys Torres
Concepção, dramaturgia, tradução, cenografia e direção: Aimar Labaki
Produção, cenotécnica e assistência de cenografia: Murillo Carraro
Figurino feminino: Fábio Namatame
Consultoria literária: Maurício Santana
Foto: Gal Oppido
Zibaldone
Oficina Cultural Oswald de Andrade
Rua Três Rios, 363 – Bom Retiro
Capacidade: 30 lugares
Duração: 60 minutos
Temporada: De 21 de agosto a 12 de setembro
Quartas e quintas-feiras, às 20h
Ingressos: Gratuito (Retirar ingressos com uma hora de antecedência.)
Classificação: 10 anos
O Poeta
Giacomo Leopardi (1798/1837) é um dos poetas mais admirados e menos conhecidos do panteão europeu. Admirado por autores como Nietzsche, Ezra Pound, Italo Calvino, Machado de Assis, Haroldo de Campos e Otto Maria Carpeaux produziu 41 poemas, alguns diálogos, uma extensa correspondência e um volume de miscelânea, misto de diário e anotações filosóficas de mais de 4000 páginas, o Zibaldoni. Entre o Amor e a Morte, seus principais temas, instalou uma discussão sobre as relações entre Sociedade e Natureza que foi, no século 20 e nesse início de século 21, recuperado como primeira crítica poética à modernidade e à revolução industrial.
Seu fôlego poético costumava se expandir em muitos versos, mas mesmo em composições curtas é possível sentir sua extraordinária capacidade de formatar a percepção em sentimento e palavras.
No Brasil, a poesia de Leopardi começa a ser conhecida através de sucessivas traduções, passando a transitar no meio literário brasileiro por volta da década de 1950-1960.
Foi traduzido, entre outros, por Machado de Assis, Vinicius de Moraes, Haroldo de Campos.
Segundo Haroldo de Campos, o poeta de ‘Recanati’ pode ser considerado, junto a Hölderlin e Mallarmé, precursor de temas de nossa modernidade, especialmente pela relação que estabelece entre língua e literatura e ciência.
(As ideias leopardianas sobre a poesia têm uma profunda ligação com os aspectos essenciais da sensibilidade contemporânea. Para Leopardi, a poesia torna-se um instrumento de autoconhecimento, e é por meio dela que o poeta expressa seus sentimentos. Dessa forma, a poesia passa a ter uma função mediadora entre o mais puro eu do poeta e o mundo, tornando o sentimento do eu-lírico porta-voz da condição existencial do homem. Leopardi tinha a consciência de que cada palavra poderia criar um efeito psicológico no leitor, podendo comovê-lo ou agitá-lo.
No Zibaldone [3139], Leopardi diz que a leitura de um poema desperta na alma do leitor: quel vivo contrasto di passioni e di sentimenti, […] e cagiona nell’animo de’ lettori una tempesta, un impeto, un quasi gorgogliamento di passioni che lascia durevoli vestigi di se, e in cui principalmente consiste il diletto che si riceve dalla poesia, la quale 51 “rejeita as classes, as distinções, os privilégios […] O conteúdo não se destaca da forma. Não existe que uma coisa, o vivente. Do seio do idealismo aparece o realismo na ciência, na arte, na história. É uma última eliminação de elementos fantásticos, místicos, metafísicos, retóricos.
A nova literatura, refeita a consciência, adquire uma vida interior, emancipada de invólucros clássicos e românticos, eco da vida contemporânea universal e nacional, como filosofia, como história, como arte, como crítica, intenta a realizar sempre mais o seu conteúdo, chama-se hoje e é a literatura moderna.” – [Trad. nossa] 38 ci dee sommamente muovere e agitare e non già lasciar l’animo nostro in riposo e in calma52 . (5-11 agosto 1823) Interessante é essa ideia de que a leitura de um poema deve produzir na alma do leitor)
O Dramaturgo e Encenador
Aimar Labaki é dramaturgo, diretor, tradutor, ensaísta e curador. Autor de textos já encenados por diretores como Gianni Ratto, Emílio de Biasi, Débora Dubois, Gilberto Grawonski, Roberto Alvim e William Pereira. Dirigiu Prova de Fogo de Consuelo de Castro, com Adriana Londoño e Dan Stulbach, Prego na Testa de Eric Bogosian, com Hugo Possolo e A Graça da Vida, de Trish Vrademburg, com Natália Thimberg, Graziela Moretto e Clara Carvalho, entre outros.
Elenco
Adriana Londoño, atriz formada pela Unicamp (Campinas, Brasil) e pela Scuola d’Arte Drammatica Paolo Grassi (Milão, Itália). Trabalhou com diretores como William Pereira, Camila Amado, Roberto Lage, Regina Galdino, João Albano e Aimar Labaki.
Clovys Torres é formado em Comunicação Social e Teatro pela Universidade Metodista. Nos últimos 20 anos tem se dedicado ao teatro em várias frentes, escrevendo, atuando, dirigindo, produzindo e desenvolvendo projetos voltados para a dramaturgia, como o Letras Em Cena no MASP. Como ator participou de mais de 20 peças teatrais e trabalhando com diretores como Elias Andreato, Leo Lama, Clarisse Abujamra, Jairo Mattos, Marcia Abujamra, Marcelo Rubens Paiva, Mario Bortolotto e Gabriela Mellão.
Foto: Gal Oppido
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