Cia. Pessoal do Faroeste sofre ação de despejo e é obrigada a entregar sede do teatro na região da Luz

Após dois anos de luta e solidariedade, companhia perde espaço localizado no centro de São Paulo, onde realizava seus espetáculos e ações sociais…

 

 

 

A Cia. Teatral Pessoal do Faroeste teve que dar adeus a sua sede no centro de São Paulo/SP. Localizado no bairro da Luz, o espaço foi utilizado por mais de 20 anos pelos artistas e membros da companhia, e devido a uma ação de despejo referente a aluguéis atrasados, teve de ser entregue aos proprietários na semana passada.

O diretor do grupo, Paulo Faria, lamentou o fim do ciclo, ao mesmo tempo em que planeja novas soluções para o futuro: “Foram décadas de trabalho duro no local, com muita doação não só pela arte em si, mas por toda a região. Lamento muito por não recebermos apoio para seguirmos fazendo nosso trabalho, que impactava centenas de pessoas, e agora a única certeza que fica é que seguiremos com nossos propósitos adiante, independentemente de onde estivermos”.

Enfrentando dificuldade há dois anos, a companhia possuía um acordo para quitação das dívidas com o proprietário, mas por conta da falta de verba, não foi possível mantê-lo. Dos 10 aluguéis atrasados que possuía, totalizando um montante de R$ 200 mil em despesas acumuladas, o Pessoal do Faroeste se via em condições de arcar apenas com parte do valor total e não conseguiu achar uma solução para viabilizar a manutenção do espaço.

 

História vinha se repetindo
No início de 2018, o espaço da companhia teatral já havia sofrido uma ação de despejo. Na época, houve uma mobilização da sociedade com a campanha #FicaFaroeste, e foi realizado um acordo com o proprietário, tendo o pagamento realizado com recursos conseguidos pelo Programa Municipal de Fomento ao Teatro.

“Naquele momento, praticamente todo o dinheiro que recebemos do fomento foi utilizado para o pagamento dos aluguéis atrasados. Conseguimos evitar o despejo, no entanto, como consequência, não contávamos mais com esse recurso para manter o espaço, e as mensalidades voltaram a se acumular”, recorda Paulo.

Durante a pandemia, sendo a arte um dos setores mais afetados, uma nova ação foi recebia por meio de um oficial de justiça. Na ocasião, havia débitos em atraso, em um momento em que a geração de renda era praticamente nula, se limitando a doações de voluntários. Além disso, alguns investimentos foram feitos do próprio bolso dos membros da Pessoal do Faroeste.

O diretor da companhia lamenta que mesmo após anos de lutas, não foi possível manter a sede: “Enfrentamos todos os momentos de dificuldade com muita dedicação. Sempre tivemos noção da importância do nosso trabalho não só para a arte como um todo, mas também pelo apoio social que dávamos ao entorno do local. Agora, as pessoas da região que contam conosco ficarão desamparadas, uma vez que o poder público historicamente mostra descaso com os moradores da região.”.

 

Ações sociais ameaçadas
As campanhas #FomeZeroLuz e #SopãoDaLuz serão interrompidas por um período indeterminado, decorrente do deslocamento da companhia. É por meio dessas ações que centenas de famílias da região da Luz conseguiam levar comida para seus pratos.

Mesmo diante das dificuldades financeiras, Paulo e os outros membros da companhia nunca paralisaram essas operações, se mobilizando para conseguirem alimentos e ajudarem as pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade.

O Pessoal do Faroeste reestruturará tais ações utilizando o Ateliê Amarelinho, que também fica na região, como local de organização para todas as atividades envolvidas.

 

 

Websérie “FOME”
Ao mesmo tempo em que a Cia. Pessoal do Faroeste enfrenta um dos momentos de maior dificuldade de sua história, o grupo segue com a transmissão de sua websérie “FOME”.

No ar desde o final do ano passado, a história se passa justamente na região da antiga sede, abordando o cotidiano de um cortiço, ironicamente as vésperas de uma ação de despejo durante a pandemia do coronavírus.

“Toda essa sucessão de acontecimentos nos fez ter uma movimentação em prol da arte, que resultou na produção de “FOME”. Espero que agora, mais do que nunca, as pessoas que assistirem a websérie possam refletir sobre as dificuldades enfrentadas pelas pessoas que residem nas proximidades da Cracolândia”, analisa Paulo.

Os episódios estão disponíveis no perfil do Instagram da companhia.

 

Sobre a Cia Pessoal do Faroeste
Em 2022, o Pessoal do Faroeste completa 24 anos. A companhia de teatro tem tido como fonte de pesquisa a vida social e política do povo brasileiro por meio de seu imaginário popular e de sua cultura, tendo um olhar especial à cidade de São Paulo, especificamente o centro, onde ficava localizada sua sede.

Com o objetivo de realizar trabalhos artísticos que reflitam momentos históricos da sociedade brasileira, sua proposta é produzir intervenções que valorizem a capital paulista, o seu centro, e crie um sentimento de pertencimento com a região, tendo uma narrativa oposta à violência que é criada pela administração pública. Era em sua sede que se desenvolviam os projetos e a contribuição para o espaço urbano e social. A Cia Pessoal do Faroeste ganhou o Prêmio Shell em 2014, na categoria Inovação pelo trabalho de ocupação e intervenção social e artística que contribui para transformação urbana da região da Luz. Em 2019, o diretor Paulo Faria recebeu da ALESP O 23o Prêmio Santo Dias em Direitos Humanos. Já em 2020, a companhia recebeu um prêmio da OAB de direitos humanos, pela luta em combate à fome e outras intervenções sociais na região da Luz.

 

Foto de Paulo Faria organizando as filas nos primeiros dias de entrega de cestas básicas do #FomeZeroLuz, em abril: Paulo Brasyl

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