De Natal (RN), coreografia Bípede sem Pelo, segue em cartaz no Sesc Avenida Paulista

Com coreografia e performance do potiguar Alexandre Américo, a criação traz inspiração da natureza afrocentrada e compartilha as práticas de danças tradicionais brasileiras, particularmente da cidade de origem do artista…

 

 

 

Alexandre Américo é artista e pesquisador da Dança pela UFRN, foi diretor artístico da Cia GiraDança de 2018 a 2023 (Natal/RN), dirige a Corpo Mudança (Fortaleza-CE) e investiga estruturas performativas, improvisação, Cripstemologia (teoria aleijada) e seus desdobramentos dramatúrgicos

Bípede sem Pelo celebra dez anos do projeto do artista e pesquisador da dança contemporânea potiguar Alexandre Américo. A montagem, com direção de Pedro Vítor, nasceu a partir das inquietações do artista sobre a natureza da morte e o desejo de repensar a concepção do ser humano como ser cultural. Nesta busca, o espetáculo se lança nas manifestações encontradas nos sambas de nossas terras para buscar nossa capacidade de estarmos conectados ao piso do planeta. A estreia em São Paulo aconteceu no Sesc Avenida Paulista, no dia 7 de junho e segue em cartaz até 30 do mesmo mês, de sexta à domingo. Confira a programação completa abaixo.

Américo deu início à montagem em 2021, fabulando um ser que se compreende parte dos mistérios das coisas que são o mundo, na tentativa de não separar natureza e cultura, passado e futuro, céu e terra, dança e técnica, carne e espírito, arte e política, vida e morte. “Fazem parte do escopo de referências deste trabalho as imagens dos orixás Omolu e Iansã com suas palhas-da-costa e seus ventos, o culto aos Egun-eguns na Bahia, a dança dos orixás, estátuas de bronze encontradas no Egito Antigo, o Manto do Bispo do Rosário, a figura do Cronos devorando o filho, bem como do Atlas suspendendo a Terra, fotografias de pessoas em transe feitas por Pierre Verger e sonoridades advindas do Oriente”, adianta Alexandre Américo sobre a base da cena desta montagem.

Em Bípede sem Pelo, a direção do artista multimídia Pedro Vítor, contribui ético-político-esteticamente por pensar a dança desde sua experiência no cinema e na política, a partir de uma percepção sensível e singular devido a sua condição neurodivergente do Transtorno do Espectro Autista. Artista PCD – TEA – trouxe, além da conformação dos conceitos e a rota do trabalho, um olhar do audiovisual, que faz parte de sua formação, e, nesse sentido, contribuiu com essa dança que é produção de imagem e que tem muita semelhança com a produção do cinema. Também traz as experiências pessoais de sua própria vida, para contribuir com essa perspectiva de direção dramatúrgica.

O espetáculo torce a ideia do animal humano, o bípede sem pelo, revelando um evento estético que nos põe em continuidade com as coisas mundanas, em giros, saltos, cruzamentos e amarrações, devolvendo-nos um saber próprio das manifestações culturais da terra. “O que se apresenta é um compartilhamento profundo e sensível das práticas de danças tradicionais brasileiras das quais eu experiencio desde criança. O mundano, aqui, se refere às coisas materiais e tudo o que é concreto. Estou interessado naquilo que foi profanado, ou seja, em tudo o que desceu do púlpito lustroso e repousou sobre a terra. É dançar para o chão, para baixo, referenciando o corpo das manifestações populares do nordeste do Brasil, em especial, de Natal (RN)”, pontua Américo.

Em sua gênese, Bípede sem Pelo faz parte da pesquisa de movimento na qual o artista mergulhou a partir de 2012 por conviver com epilepsia mioclônica juvenil, uma síndrome epiléptica generalizada caracterizada por abalos involuntários nos membros, especialmente nos braços e nas mãos, além do TDAH. Desde então, Alexandre se debruçou em pesquisar um modo de se mover a partir desses movimentos involuntários típicos de sua condição. “Não consigo realizar frases de movimentos preestabelecidas. Tudo o que faço precisa ter um alto grau de liberdade de escolha. Cada dia da peça é uma apresentação única”, revela o artista.

Assim, sua pesquisa de movimento surge a partir de uma possível impossibilidade à dança. Para persistir na dança, precisou se entender como improvisador e a gestar seus trabalhos a partir de sua singularidade. “Danço improvisando assuntos corporais que variam entre os espasmos mais intensos vindos do TDAH a linhas mais pontuais e suavizadas. Danço alargando meu sentimento de liberdade para que eu não convulsione. Assim, este modo de se mover passa a percorrer toda a minha trajetória ao longo desses 10 anos”, revela.

Para o coreógrafo, é preciso admitir que a invenção do Homem ou Animal Humano individual e apartado da natureza é a receita para a catástrofe do planeta. Vale pensar que não são todas as culturas que o ser se percebe de maneira individualista. “O Homem é uma invenção moderna e por isso pretendo torcer essa noção, reinventá-la. Inventar um outro bípede sem pelo”, finaliza Alexandre Américo.

 

Alexandre Américo
Artista e pesquisador da Dança com Licenciatura em Dança e Mestrado pelo PPGARC, ambas pela UFRN, foi aluno especial de Doutorado em Estudos da Mídia (UFRN) e Diretor Artístico da Cia GiraDança de 2018 a 2023 (Natal/RN). No momento, dirige a Corpo Mudança (Fortaleza-CE) e é atuante na área da investigação em Arte Contemporânea, com enfoque em estruturas performativas, improvisação, Cripstemologia (teoria aleijada) e seus desdobramentos dramatúrgicos. Com um perfil que transita com facilidade entre a academia e o palco, Alexandre acredita que teoria e prática caminham de mãos dadas, uma servindo à outra.

“Toda a minha formação no universo da dança cênica se deu, simultaneamente, dentro e fora dos espaços acadêmicos, e por isso me empenho em borrar as fronteiras entre o que é e o que não é academia. Penso que fazer dança é fazer conhecimento, e por isso me interesso em tecer um diálogo constante entre autores dentro de minhas criações. Para esta peça, em especial, tenho como suporte teórico o texto ‘Bípedes Sem Pelo: o caso das emoções’, do Prof. Dr. Marcos Bragato, para me ajudar a pensar o que é esse humano dentro da ciência em relação à dança. E com o Michel Maffesoli e seu livro ‘Ecosofia: uma ecologia para nosso tempo’, que me auxilia no entendimento desse humano contemporâneo que busca se relacionar de maneira a não se separar da natureza e seus processos”, reflete Américo.

O coreógrafo deseja também que este trabalho alcance os segmentos LGBTQIAPN+, PCD, negro, pessoas marginalizadas e periféricas, e quer fazer compreender que a vida sem um senso de comunidade não vale a luta. “Devemos nos voltar profundamente à nossa relação com a terra, com a ancestralidade viva que nos rege. Entender que, ao refletir sobre a morte, podemos descobrir outros modos de encarar a vida para além daqueles impostos pela máquina capitalista que tanto devora nosso axé, nosso pulso de vida. Faço uma dança para alargar a liberdade de nossas ínfimas e poderosas existências. Para reelaborarmos, coletivamente, quem somos a partir de uma noção de corresponsabilidade com o decurso do mundo”, finaliza.

Sinopse
“O Bípede perdeu os pelos, o cérebro, a razão. Ele gira e na gira faz do mundo a carne de seu corpo”.
Esta peça torce a ideia do animal humano, o Bípede Sem Pelo, e revela, assim, feito um corpo-que-dança-em-transe-que-dança-corpo, um evento estético que nos põe em continuidade com as coisas mundanas, em giros, saltos cruzamentos e amarrações, devolvendo-nos um saber próprio das manifestações culturais da terra.

Ficha Técnica
Dança e Coreografia: Alexandre Américo
Direção: Pedro Vitor
Interlocução Cênica: Laura Figueiredo
Interlocução Coreográfica: Elisabete Finger
Cenografia: Ana Vieira e Jô Bomfim
Luz: Camila Tiago
Montagem de luz: David Costa
Operação de Luz: Nicholas Matheus e Pedro Vitor
Fotografia divulgação: Carol Pires, Cayo Vieira, JAN e Maria Antônia Queiroz
Design Gráfico: Yan Soares e Maria Antônia Queiroz
Produção: Listo Produções – Celso Filho e Corpo Rastreado – Lucas Cardoso
Comunicação: Paulo Nascimento
Assessoria de Imprensa: Canal Aberto – Márcia Marques, Daniele Valério e Flávia Fontes

 

 
Bípede sem Pelo
Com Alexandre Américo (RN)
Sesc Avenida Paulista
Estúdio (4º andar).
Avenida Paulista, 119, Bela Vista, São Paulo
Fone: (11) 3170-0800
Transporte Público: Estação Brigadeiro do Metrô – 350m
Temporada: até 30 de junho de 2024.
Sextas e sábados, às 20h30
Domingos e feriados, às 18h30.
Duração: 60 minutos.
Classificação indicativa: 16 anos.
Ingressos: R$40,00 (inteira), R$20,00 (Meia) e R$12,00 (Credencial plena).
Horário de funcionamento da unidade:
Terça a sexta, das 10h às 21h30. Sábados, das 10h às 19h30. Domingos e feriados, das 10h às 18h30.

Foto: Jorge Farias

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