Espetáculo-instalação que transita entre teatro, cinema e música é inspirado na peça de teatro iídiche Um Sonho de Goldfadn, de Jacob Rotbaum. Público é levado para as ruínas do Teatro TAIB seguido de uma imersão entre duas telas com projeções diferentes…
Um teatro em risco, um filme feito dentro de um teatro falando sobre o próprio fazer teatral, um teatro em ruínas, uma fábula com linguagem contemporânea. Leste, é a nova produção da Casa do Povo que conta com Martha Kiss Perrone na adaptação, direção e dramaturgia. Com estreia dia 11 de novembro, quinta-feira, às 20h, na própria Casa do Povo, Leste traz à cena o processo de criação de um espetáculo em uma experiência de teatro expandido com recursos cinematográficos.
Entre sonho, ficção e documento Leste surge a partir da peça de teatro iídiche Um Sonho de Goldfadn, de Jacob Rotbaum, diretor judeu polonês que desembarcou no Brasil em 1948 após a Segunda Guerra e fez sua montagem no Teatro Municipal com atores ligados à Casa do Povo então em construção. A convite da Casa do Povo, a diretora Martha Kiss Perrone reimaginou a peça a partir do texto original, dialogando com os tempos de hoje.
Idealizada por Benjamin Seroussi e Hugueta Sendacz, Leste tem elenco formado por Amanda Lyra, André Lu, Assucena Assucena, Heitor Goldflus, Rodrigo Bolzan e Vitória Faria e começou a ser gestado como peça de teatro. A ideia inicial era ter uma montagem com atores e músicos e um filme realizado ao vivo que acontecesse em vários espaços da Casa do Povo, levando o público a percorrê-los. Com o endurecimento da pandemia, o espetáculo migrou para o cinema, mas manteve o conceito original de instalação imersiva. “Leste é o teatro em exílio no audiovisual”, define Martha Kiss Perrone.
Leste conta a história de um teatro em risco, quando o diretor de um velho teatro em Varsóvia resolve tirar de seu repertório todas as peças iídiche depois que o ator principal é preso pela polícia política. Num delírio fantasmagórico, o contrarregra convoca então os próprios personagens e paisagens vindos do Leste Europeu das peças de Goldfadn, pai do teatro iídiche, para salvar o teatro, como artesãos, mascates, partisans, bruxas, mulheres em fuga e florestas.
Ruínas do Teatro TAIB
Mescla de instalação, teatro, cinema e música, Leste leva o público para uma viagem por dentro do espetáculo e suas filmagens nos espaços da Casa do Povo. O prólogo acontece nas ruínas do Teatro TAIB vistas a partir do balcão do teatro desativado, que se encontra fechado há anos no subsolo do centro cultural do Bom Retiro. O público ouvirá gravações de textos e depoimentos dos atores, além de poder ver a cenografia das filmagens.
Na sequência, o público se desloca para o grande salão da Casa do Povo no segundo andar. O local terá duas telas que projetarão o filme simultaneamente (as mesmas cenas, mas com olhares diferentes), sendo que a plateia estará acomodada no meio. A instalação se completa com cenografia e iluminação pensadas para uma completa imersão dos espectadores.
Para Martha Kiss Perrone, que já criou e esteve em cartaz com alguns espetáculos na Casa do Povo, como Rózà, sobre a revolucionária Rosa Luxemburgo, Revolta Lilith e Quando Quebra Queima com a coletivA ocupação, Leste é uma investigação profunda do que é fazer teatro. “Estamos falando de uma língua que atravessou territórios, do ato de contar histórias e a luta do teatro para que essas histórias não sejam perdidas. Acredito que um dos temas principais do espetáculo é a ruína, a linguagem, o teatro em risco e conexões que isso traz no nosso tempo”, explica a diretora.
Já para Benjamin Seroussi, diretor executivo da Casa do Povo, Leste convoca a potência dos sonhos para salvar um mundo desmoronando. Em um contexto mundial de pandemia, e narrativas centradas nas mortes, a peça ressurge para levantar imagens e perguntas que colocam a vida no centro. “Mesmo em risco, os espaços artísticos assim como os povos, as línguas e as histórias dissidentes seguem vivos e serão convocados para a estreia do espetáculo”, afirma ele.
Processo teatral e cinematográfico
Apesar de possuir toda a genealogia de um espetáculo teatral, Leste transborda a fronteira da linguagem e usa todos os recursos do cinema reunindo artistas de diferentes trajetórias. Para transpor a fábula original de Rotbaum para o audiovisual, a obra ganhou integrantes de peso, como os diretores de fotografia Paula Serra e João Atala, que trabalhou com a diretora Petra Costa.
“A obra é um híbrido de teatro e cinema, pois por mais que seja um filme ele foi ensaiado e filmado em um Teatro. As duas telas provocam o público dentro do filme, dentro do sonho desse guardião do teatro. Ficção e realidade se misturam em uma linguagem onírica, e ao mesmo tempo festiva”, enfatiza Martha Kiss Perrone.
A música também marca presença dentro desse processo de teatro e cinema. Criada durante os ensaios e as filmagens com direção de Juliano Abramovay, que buscou inspiração na música klezmer, um estilo musical típico das festas judaicas da Europa do Leste, a música também joga com a ambiguidade presente na obra, como passado e presente, partidas e chegadas, derrota e reconquista e sonhos e assombrações.
“Mais de 70 anos depois, essa montagem coloca o enredo original da peça em fricção com o tempo presente: movimentos sociais, diásporas contemporâneas, censuras e a importância de sonhar e do fazer teatral”, acredita Benjamin Seroussi. “O teatro ídiche sofreu um corte violento com os massacres da Segunda Guerra Mundial e nós aqui somos herdeiros de uma tradição que não nos foi ensinada, então é preciso reinventá-la! Leste nasce nesta brecha!” completa Seroussi.
Ficha Técnica
Idealização: Benjamin Seroussi e Hugueta Sendacz, a partir da peça O Sonho de Goldfadn de Jacob Rotbaum
Direção: Martha Kiss Perrone
Adaptação e dramaturgia: Martha Kiss Perrone
Roteiro filme: Martha Kiss Perrone em colaboração com João Turchi
Colaboração roteiro: Murilo Hauser, Jaya Batista
Textos: João Turchi, Icaro Pio, Amanda Lyra, Rodrigo Bolzan, Assucena Assucena, Hugueta Sendacz, Martha Kiss Perrone e trechos de Alain Brossat e Sylvie Klingberg (Yiddishland Révolutionnaire).
Texto Todos Os Santos: Ícaro Pio e André Lu
Atores: Amanda Lyra, André Lu, Assucena Assucena, Heitor Goldflus, Rodrigo Bolzan, Vitória Faria, Ariane Aparecida, Nina Hotimsky, Ícaro Pio, Betty Poquechoque, Sonia Limachi Quispe, Yenny Rodrigues Cruz e Elizabeth Mariela Cuaremayta Mamani.
Direção musical: Juliano Abramovay
Músicos: André Vac (violino e baixo), João Batista Brito (clarinete, sax tenor), Quiriku (clarinete) e Vitória Faria (sanfona).
Colaboração musical e tradução do texto original: Hugheta Sendacz
Música adicional no filme: Álbum Aló de Juliano Abramovay e João Batista Brito
Assistência de direção: Jaya Batista e Anelena Toku
Preparação corporal: Jaya Batista
Fotografia filme: Paula Serra e João Atala (primeira etapa filmagem) e Cris Lyra, Ariel Schvartzman e Paula Serra (segunda etapa filmagem)
Filmagem adicional: Janaína Wagner, Martha Kiss Perrone
Assistente de câmera: Alicia Esteves
Coordenação filmagem: Paula Serra
Edição: Diego Arvate e Fernando Coster
Desenho de som e mixagem: Edson Secco
Tratamento de cor e finalização: Brunno Schiavon e Isabel Beitler
Direção de arte e cenografia da instalação: Frederico Ravioli
Assistência direção de arte: Maíra Suzuki
Assistência direção de arte e de cenotécnica: Ìcaro Pio e André Melhado Araujo Lima
Pintura: Frederico Ravioli, Gabriel Ussami e Maíra Suzuki
Apoio cenotécnica: Jeff Lemes (primeira etapa filmagem)
Figurino: Gabriela Campos
Assistente de figurino: Juliana Del Rosso e Ariane Aparecida Fachinetto
Desenho de luz: Giulia Martini
Assistente de iluminação: Bê Camelo e Felipe Stucchi
Técnico implementação de luz: Pajeú
Captação de som: Rafael Coutinho
Assistente de captação de som: Vanessa Gusmão
Condução de Iídiche: Gustavo de Oliveira Emos
Direção de produção: Carla Estefan (ensaio e filmagem)
Produção executiva e coordenação finalização filme: Patricia Iglecio
Assistente de produção: Juliana Mattar
Estagiário de produção: André Melhado
Gestão de projeto: Metropolitana Gestão Cultural e Casa do Povo
Estagiários de produção: Chiara Iglecio e Letícia Karen
Produção Casa do Povo: Marcela Amaral e Leonardo Monteiro
Assessoria de imprensa: Frederico Paula – Nossa Senhora da Pauta
Fotos: Paula Serra
Operador de som temporada: Tomé de Souza
Operador de vídeo e luz: Henrique Andrade.
Agradecimentos: Renato Sztutman, Jean Tible, Sarah Sztutman, Lia Sztutman, Suely Rolnik, Silvio Band, Fernando Nogari, Petra Costa, Monstercam, Electrica, Sonidera e Mendelics.
Curiosidades
O espetáculo marca a estreia da cantora Assucena Assucena, integrante da comunidade judaica, como atriz.
O Teatro TAIB foi o local de estreia como ator de Rodrigo Bolzan com 17 anos.
A primeira montagem de Um Sonho de Goldfadn em 1948 contou com a participação de atores profissionais e amadores e com uma grande mobilização da comunidade judaica do Bom Retiro e dos seus pequenos grupos de teatro. Essa mesma comunidade estava construindo a Casa do Povo e projetando o TAIB, teatro que se tornou, anos depois, palco de importantes companhias.
O polonês Jacob Rotbaum foi diretor do Teatro Estatal de Wroclaw, na Polônia.
Considerado perdido, o texto de Um Sonho de Goldfadn foi encontrado recentemente em Varsóvia por Dorota Kwinta, do Instituto Adam Mickiewicz.
A diretora Martha Kiss Perrone em viagem de pesquisa à Polônia teve acesso e recuperou as partituras musicais originais da peça que foram reescritas pelo músico Juliano Abramovay para esta versão.
A mãe de Hugueta Sendacz, uma das idealizadoras de Leste, integrou o elenco de Um Sonho de Goldfadn em 1948 na montagem paulistana.
Atualmente o iídiche é falado somente por um milhão de pessoas em todo mundo, sendo que 600 mil são religiosos.
As cidades de Nova York (Estados Unidos) e Buenos Aires (Argentina) ainda produzem e apresentam espetáculos de teatro iídiche.
Leste
Casa do Povo
Rua Três Rios, 252 – Bom Retiro – São Paulo.
(11) 3227-4015 | casadopovo.org.br.
Capacidade: 50 pessoas por sessão
Temporada: De 11 de novembro a 05 de dezembro
Quinta-feira a sábado, às 20h
Domingo, às 19h
Ingressos gratuitos em sympla.com.br/leste__1388892
Duração: 90 minutos
Classificação: Livre
05Foto: Divulgação
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