Cinco gotinhas debaixo da língua trata de assunto sério com humor

Texto e atuação de Vinicius Cattani, direção de Nello Marrese…

 

 

 

 

Foi durante o período de sua recuperação, depois de sofrer grave acidente de carro, que o ator Vinicius Cattani conheceu o Rivotril. O desafio de conseguir dormir à noite, após passar boa parte do dia deitado, nos oito meses de tratamento, era vencido com as gotinhas do tarja preta. A experiência pessoal rendeu inspiração para a comédia Cinco gotinhas debaixo da língua. Vinicius Cattani entra em cena para interpretar o próprio texto, que marca sua estreia como dramaturgo. Com direção de Nello Marrese, o solo – com trilha sonora de Tiago Abreu, cenário de Júnior Carvalho, figurino de Bruno Ribeiro e luz de Zé Guilherme Bueno, no Teatro Uol, para temporada aos sábados, às 22 horas, até 31 de agosto.

Em uma hora de espetáculo, o público acompanha um dia na vida de um funcionário de escritório que, incapaz de lidar com a própria infelicidade, busca aliviar sua caótica rotina com a ingestão descontrolada de um ansiolítico em gotas. A comédia faz uma divertida crítica ao imediatismo e reflete sobre sentimentos como solidão e carência brincando com a ansiedade do personagem. O solo lança um olhar bem-humorado sobre uma geração de pessoas relativamente bem-sucedidas, solitárias e imediatistas, que buscam a solução de seus problemas da maneira mais fácil possível. Tomam pílulas e acreditam encontrar a tal plenitude da vida. Seus melhores amigos são os celulares, e com eles mergulham no mundo virtual procurando uma maneira de viver a vida real. O título da peça faz referência também às cinco miligramas do hipnótico Zolpiden, que, junto com o Rivotril, está entre os remédios mais vendidos no Brasil. Mesmo sendo uma comédia, o assunto da peça é sério: o descontrole das pessoas ao usarem este tipo de medicamento.

 

O sonho de ser piloto de avião
Recuperado do acidente, quando a vida retomou Cattani parou de tomar o medicamento; entretanto, quando decidiu largar a carreira de ator e realizar o sonho de ser piloto e entrar para a aviação, voltou a tomar. Contratado, passou a sofrer as pressões impostas a maioria dos profissionais que convivem com alta carga horária em trabalho estressante. “A quantidade do medicamento foi aumentando até que um dia tomei um frasco inteiro”, revela. O vidro não estava cheio e não era uma tentativa de atentar contra a vida. “Mas a pessoa se torna resistente e toma descontroladamente.” Depois deste dia, resolveu que era preciso dar um jeito na situação e consultar um médico, começar um tratamento. Queria parar de se automedicar e de comprar a droga de maneira ilegal.

O inédito monólogo marca o retorno de Cattani ao ofício de ator, iniciado por ele em 2000, como integrante da Cia Os Fodidos Privilegiados, de Antônio Abujamra. Desde 2010, quando deixou o teatro para ser piloto de avião, ele não interpretava uma montagem presencial. Voltou à cena em janeiro de 2022, no elenco de “Touch”. “De uma maneira divertida e leve, a peça aborda assuntos bem delicados e traz também uma mensagem que vai gerar identificação com a vida das pessoas no momento atual”, avalia Vinicius. “O texto tem um ritmo frenético do início ao fim, indo direto ao ponto, sem rodeios, passando por uma análise que aponta uma conclusão e vai seguindo adiante”, acrescenta o ator.

 

Mais sobre Vinicius Cattani
Hoje com 38 anos de idade, Vinicius Cattani deu os primeiros passos no teatro atuando em Michelangelo, de Doc Comparato, em uma montagem da Cia Os Fodidos Privilegiados no teatro João Caetano, no ano 2000. “Desde então, eu trago duas grandes referências: a emoção de Camila Amado, com quem pude fazer vários trabalhos, e a lente de aumento de Antônio Abujamra (criador da Cia Os Fodidos Privilegiados)”, conta Vinicius. Adepto do Método Stanislavski, o ator estudou na Escola de Artes Teatrais de Moscou, na Rússia, entre 2004 e 2005. Ao voltar, fez parte do elenco de “Ariano”, em 2007, peça em homenagem aos 80 anos de Ariano Suassuna.

Com a montagem, Cattani viajou em temporada por teatros de cidades ao longo do Velho Chico, de Minas a Pernambuco, terminando na Paraíba, terra de Suassuna. Em 2008, rodou o Brasil dividindo a cena com Cristina Pereira, no sucesso de bilheteria “Alzira Power” (texto de Antônio Bivar, 1969). Em 2009, encenou “O túnel”, obra de Dias Gomes. Em 2010, Cattani resolveu realizar o sonho de trabalhar na aviação. Virou piloto de jatos executivos e acumulou mais de 1.500 horas de vôo entre Rio, São Paulo e Belo Horizonte. 10 anos depois, largou os céus para voltar aos palcos, retorno que adiou por dois anos por conta da pandemia de Covid-19. Em 2022, estreou seu solo com três temporadas no Rio de Janeiro. Em 2023, no Sesi-SP, participou do sucesso “De perto ninguém é normal”, alem de compor o elenco de “O Alienista” e “Casa caramujo”.

 

Sobre a montagem
Ao estrear na direção, Nello Marques diz que contou “apenas com o texto e muito com o talento do ator”. Para passar a ideia de que o personagem se encontra um escritório cheio de pessoas, o diretor optou por quebrar a quarta parede e se dirigir à plateia. “Com cuidado pra que ninguém se sentisse constrangido. Precisamos também tirar qualquer ar de autoanálise, ou autobiografia. Conseguimos, através da sonoplastia e iluminação, criar a dinâmica de presente/passado. Mesmo o tema automedicação sendo espinhoso, conseguimos seguir o que o texto propõe, humor. Em nossa temporada no Rio de Janeiro, observamos a identificação da plateia com a situação vivenciada pela personagem. Elas riam de si mesmas…”

Sobre a trilha sonora, Tiago Abreu explica que ela foi criada no decorrer do processo de trabalho. “Como também fiz a assistência de direção, à medida que os ensaios aconteciam, o texto, o ator e o trabalho da direção foram servindo de inspiração. Ela foi pensada para ajudar o ator a contar a história já que ele contracena e reage às intervenções sonoras, que vão de trovões a badalar de sinos, a todo momento. As poucas músicas propriamente ditas aparecem em momentos bem marcados para criar climas, quase sempre cômicos, mas que, ao mesmo tempo, revelam o quão atormentada pode ser e mente humana.” O figurino de Bruno Ribeiro alia conforto e funcionalidade. “Como o personagem faz parte do mundo corporativo, o trabalho foi viabilizar conforto num traje tradicional, um costume (calça, blazer e camisa) que permitissem a livre movimentação do ator, que gesticula bastante durante o espetáculo.”

 

Sobre o texto
Um sujeito de seus trinta e poucos anos, relativamente bem-sucedido, solitário e em busca de felicidade, procura nos aplicativos uma saída para sua infelicidade com o trabalho, a rotina, as coisas da vida pessoal e os relacionamentos. É hipocondríaco, viciado em ansiolíticos. “Se está sentindo uma dorzinha de cabeça, já toma um remédio. O que for de mais imediato que possa trazer resultado ele faz. Mergulha no mundo virtual para achar um caminho de viver o real. O personagem é esse – um cara que está à beira de um ataque de nervos”, detalha Vinicius. Após passar quase toda noite em claro tentando dormir, o personagem não se rende até que às três da manhã resolve tomar cinco gotinhas de um remédio para dormir, mesmo precisando acordar as seis para trabalhar, ou seja, em três horas. Antes de sair de casa, ele consulta a previsão do tempo, decide confiar… “Por que não? Só está nublado…”

E pontualmente lá está ele na porta do escritório, exatamente como jamais desejaria estar: com sono, cansado e todo molhado. “É… a previsão errou de novo.” Se a situação que se encontra já é bastante irritante por si só, imagine lidar com todas as pessoas do escritório após o fim do home office, pensa o jovem. Reencontrar todas aquelas pessoas que deixam sua rotina ainda mais cansativa… tem reunião, tem prazo, tem relatório, tem planejamentos, tem isso, tem aquilo… Tem que, tem, tem, tem… Mas também tem as cinco gotinhas para ajudar o equilíbrio desse jovem trabalhador à beira de um ataque de nervos, que nem ele sabe como chegou a esse ponto. E assim começa sua segunda feira…

Ficha técnica
Texto e interpretação: Vinicius Cattani. Direção: Nello Marrese. Assistente de direção: Tiago Abreu. Cenário: Júnior Carvalho. Figurino: Bruno Ribeiro. Luz: Zé Guilherme Bueno. Designer gráfico: Lucas Ottavio. Trilha Sonora: Tiago Abreu. Assessoria de Imprensa: Arteplural / M. Fernanda Teixeira. Relações publicadas: Ika Tronco. Gestão de tráfego pago: Emmanuel Aguilera. Fotografia: Raphael Molinero. Videomaker: Rafael Thomazini. Produção executiva: Zé Guilherme Bueno. Realização: 5 Gotinhas Produções.

 

 

 

 

 

Cinco gotinhas debaixo da língua
Teatro Uol
Av. Higienópolis, 618 – Higienópolis, São Paulo
Temporada: De 3 a 31 de agosto
Sábados, às 22h
Duração: 60 minutos
Ingresso:
Setor A – R$ 100,00 Inteira e R$ 50,00 meia.
Setor B – R$ 80,00 inteira e R$ 40,00 meia.
Vendas antecipadas: www.teatrouol.com.br
Classificação: 14 anos

 

Foto: Julieta Bacchin

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